CAIO FERNANDO ABREU: Uma poética da alteridade e da identidade
O livro de Mírian Freitas é um ensaio ilustrado com imagens de Bob Wolfenson (capa e miolo), Adriana Franciosi, Juan Esteves, Juvenal Pereira, Paulo Giandalia, Marcos Santilli e também dos arquivos do autor que estão no espaço de documentação e memória cultural- DELFOS PUCRS
Caio Fernando Abreu: uma poética da alteridade e da identidade apresenta ao leitor a abordagem da produção contística desse autor, centralizando a análise de suas narrativas na reflexão e investigação sobre a ambígua e inconclusa natureza das identidades dentro de um contexto pós-moderno, que trata a questão do Outro não como uma entidade fixa, objetiva, mas capaz de ser construída pelo sujeito em sua relação com o mundo. Nesse sentido, o foco central deste estudo é examinar a produção literária desse autor de 1960 a 1990, na busca de traços identitários de narrativas que assumem a errância e desestabilizam nossas concepções tradicionais de identidade, em que o sujeito, muitas vezes, pela lente do observador, é considerado como “estranho”, ao exprimir suas escolhas pelo viés da heterogeneidade nas margens contínuas da transição. Com isso, neste livro, discutiu-se o fio condutor que revela as semelhanças e as diferenças do indivíduo, a partir de valores culturais e de uma ordem das relações humanas que filtram a percepção dos acontecimentos pelo prisma da subjetividade.
Observa-se neste estudo que o movimento contínuo e veloz que conduz os constantes estados insólitos e instáveis das identidades está relacionado, consequentemente, aos fenômenos da globalização e da modernidade que fazem com que as personagens caioferdianas não atinjam a satisfação íntima e se percam em suas próprias buscas interiores, revelando-se “inacabadas” na indefinição de um “rosto”, estando confinadas às incertezas e às vulnerabilidades de uma infinita trip existencial.
Caio Fernando Abreu foi um escritor camaleônico que, ao longo de três décadas de escrita, mostrou as diversas faces de uma produção artística marcada pela fluidez, pelo fluxo de consciência e pela releitura de um mundo cada vez mais líquido, com valores que se desmanchavam no ar à medida que caminhávamos para o fim do século XX. Igualmente, foi um homem inquieto, um espírito livre em constante processo de (re)construção de si mesmo. Não se limitava, não se aprisionava, mesmo quando a realidade lhe impunha limites cruéis.
O livro de Mírian Freitas, resultado de um acurado trabalho de pesquisa e de um sensível processo de seleção, mostra como nenhum outro as diversas faces desse homem singular, explorando múltiplos olhares sobre essa emblemáti– ca figura. Caio Fernando Abreu foi a voz de uma geração que rompeu paradigmas e resistiu ao aparato repressivo em um contexto em que a democracia brasileira e a liberdade de expressão artística tornavam-se cada vez mais utópicas.