Conto familiar – Mario Quintana

A linguagem que Quintana utiliza em seus textos é simples, fluida, introspectiva e, muitas vezes, irônica. Temas como o amor, o tempo, a natureza são os preferidos do poeta. Mestre da palavra, do humor e da síntese poética, em 1980 recebeu o Prêmio Machado de Assis da ABL e em 1981 foi agraciado com o Prêmio Jabuti.

Conto Familiar

Era um velho que estava na família há noventa e nove anos, há mais tempo que os velhos móveis, há mais tempo até que o velho relógio de pêndulo. Por isso estava ele farto dela, e não o contrário, como poderiam supor. A família o apresentava aos forasteiros, com insopitado orgulho: “Olhem! vocês estão vendo como ‘nós’duramos?!”
Caduco? Qual nada! Tinha lá as suas ideias. Tanto que, numa dessas grandes comemorações domésticas, o pobre velho envenenou o barril de chope.
No entanto, como era obviamente impraticável — a não ser em novelas policiais — deitar veneno nas bebidas engarrafadas, apenas sobreviveram os inveterados bebedores de coca-cola.
— Mas como é possível — lamentava-se agora tardiamente o pobre velho —, como é possível passar o resto da vida com esses? Com gente assim? Porque a coca-cola não é verdadeiramente uma bebida — concluiu ele —, a coca-cola é um estado de espírito…
E, assim pensando, o sábio ancião se envenenou também.

O amado, singelo e popular Mário Quintana

Mário Quintana, gaúcho, foi poeta, tradutor e jornalista. Mestre da palavra, do humor e da síntese poética, em 1980 recebeu o Prêmio Machado de Assis da ABL e o Prêmio Jabuti em 1981. Seus poemas e frases circulam livremente nas redes sociais mantendo viva a memória e o encanto de sua obra

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