Poemas de André Sousa
André Sousa é pesquisador, fotógrafo e jornalista em formação. Tem poesias publicadas em sites e revistas on-line e escreve sobre cultura e outros nomadismos na plataforma Medium.
1.
o que consumi daquela terra
foi uma lasca, como um beijo
no prato após dias em jejum
no meu caso, anos sem degustar
algo que não fosse insosso
[e saber
que o pior dessabor
é parecido com tocar algo
[e nada sentir
o que consumi daquela terra
me privou da fome
de olhar ao largo
[e não ver a vertigem
de cheirar o cacto sem nome em latim
[e não sangrar as narinas
de pisar a brasa do chão no meio dia
[e não nascer o berro
***
2.
fiapos de sol
entre os arbustos
cutucam a terra
raízes em chamas
nascem nos olhos
do velho pássaro
que corta o tempo
que bica meu peito
a procura de ninho carcaça ou coisa parecida
o velho pássaro
abre [ainda] minhas entranhas [aos poucos]
como quem não tem pressa
de romper o limbo
nem findar
o dia
o velho pássaro
e o ninho-carcaça
entre arbustos secos
abraçam o que resta de sol
como quem protege
o último suspiro
de uma vela
***
3.
querem que esse silêncio
seja engolido como cápsula edificante
sem água nem espasmos nem melancolia
querem deixar os dentes trincados
depois da sequência de naipes de murros
e verdades retiradas a fórceps e joelhos e pés na garganta
querem suplícios em praça pública
e palmas histéricas para dar ibope
entre os que sobram
querem o ódio plástico como mantra
fábula infantil contada no smartphone
com versículo e moral sem História
querem um atestado de eternidade
mimeografado no corpo do sangue
do outro sem nome
sobre o autor
André Sousa nasceu em Fortaleza, Ceará. É pesquisador, fotógrafo e jornalista em formação. Tem poesias publicadas em sites e revistas on-line e escreve sobre cultura e outros nomadismos na plataforma Medium