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Poemas de Miró da Muribeca

Poemas de Miró da Muribeca

Miró da Muribeca é o nome poético e encarnado de João Flávio Cordeiro da Silva, poeta e performer. Nascido no bairro de periferia Muribeca, em Recife (PE), é figura conhecida no circuito artístico alternativo da cidade. Publicou diversos livros de forma independente, entre os quais Quem descobriu o azul anil? (1984), Pra não dizer que não falei de flúor (2004), DizCrição (2012), aDeus (2015), a coletânea Miró até agora (2016) e O céu é no sexto andar (2021), o mais recente. 

Carnaval 

Deus largado pelas ruas de Recife 
não sabe se dança frevo 
ou vai atrás do maracatu 

será que Deus também tem dúvidas? 

nas ruas 
igrejas e povo 
Deus deixa beijar 
usar a roupa que quiser 

são quatro dias 
que Deus não tá nem aí 

aí, na quarta-feira de cinza 
Deus de ressaca 
perdoa quase todo mundo 

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– Poema do livro aDeus (Mariposa Cartonera) 

  

★★★ 

olhei para o passado 
as folhas dos calendários 
caindo 

é preciso plantar cedo sua árvore 
pra mais tarde ter uma sombra 
que lhe agasalhe 

– Poema do livro aDeus (Mariposa Cartonera) 

  

  

  

★★★ 

fui pra lá e pra cá 
55 anos 
ando ainda sem 
entender nada 
inda + agora 
que Deus deu 
de ombros ao mundo 
e o ser humano 
deu as costas 
às coisas raras 
como uma boa risada 

– poema do livro O penúltimo olhar sobre as coisas (Mariposa Cartonera) 

  

★★★ 

tem gente que nunca andou de bicicleta 
mas sabe pedalar a sua vida 
tem gente quem fuma cigarro e morre de câncer 
antes de quem fuma maconha 
tem gente que diz bom dia 
e do nada morre à tarde 
tem gente que nunca foi ao cinema 
e sua vida virou filme 
tem gente que compra carros novos 
e morre atropelado 
tem gente que pensa que é moderna 
e é primata até dizer bosta 
tem gente que se falta luz 
nem um candeeiro acende 

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tem gente que nem o poste suporta 

tem gente que no bar fala demais 
e esquece de pagar a conta 
tem gente que nem a conta paga 

e os dinossauros nunca souberam 
que o homem existiu 

– poema do livro O penúltimo olhar sobre as coisas (Mariposa Cartonera) 

  

★★★ 

  

fico olhando o mundo 
não me sinto bem agora 
agora sinto um 
desejo 
de não estar mais aqui 

mas agora que aqui estou 
suporto meus 
54 quilos 
e vários amores que se foram 

a vida é um ônibus 
vai levando você 
o problema é em que parada 
nós vamos descer 

– poema do livro O penúltimo olhar sobre as coisas (Mariposa Cartonera 

 

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