Poemas de André Siqueira
Jazz na tua ópera
o eco do meu espirro friento
Thelonious Monk e a garoa
e no meio da rua a iminência
dos ventos desobstruindo os olhos
em vão desvairados
aperto-os obstinados no bebop
que é agora madrepérolas
eu reativo de jaqueta de recontro
nas fuzilarias com riffs lancinantes
que alegam: quedar-se febril longínquo…
passar manteiga de cacau nas veias
tépidas porque de corte em corte
na campa colhe-se a sina em si mesma
cor violeta no colo hipérbole sobe a
serra de mim a fustigar a lembrança do
happy birthday da amiga
e o bebop
Monk
os olhos em vão
consumidos
sem baixas na noite
sem baixas
já enfileirados os faróis no ponto
onde terminaste a viagem das
minhas mãos trêmulas de tanto
encontro no desassossego duma
bomba desarmada
20 de julho e o tempo
O tempo.
Aplacá-lo, interrogá-lo,
inquiri-lo, investigá-lo.
O relógio de antanho.
O de agora pende sobre mim.
Sou deitado assombro.
O tempo (esse clichê avolumado)
perpassa espectralmente.
Fui digerido, digeridos fomos.
Fica esse arroto do tempo.
Verdugo taciturno em horas.
Recuperação do cansaço
O grande som do avião atravessa a noite. No sofá, à meia-luz, enquanto o macarrão não fica pronto, velo a vida ancorada nos quartos vazios, engolindo coaxos longos e maduras ventanias.
De súbito, atacada
Ele usava a internet. Tamborilava o instante
e eu viscosa de roldão ressuscitava pechas
esvaecidas quando desenhava escaravelhos no
copo descartável puro rosa pulando muros de
flauta onde merencórios encantamentos
dessedentavam. Um vão entre nós. Verdi. Réquiem
com gelo por favor. Um rio de ternuras
transversais salgando a esfinge de atonia.
Prafrentex ele dizia ou balbuciava – fones
no ouvido decido. Meia levemente desabrocha
furo primário no dedão. Vigia intimista.
Bandas da hora, seu bárbaro anseio
e curiosidade! De pensar nas luvas, no
fetichismo dos cartões-postais afagados na
marinha – mania que percebi sutil – unida
ao marco embebido de fulgores… Ai
que à tarde granizos testam-nos.
Estralinhos divinos são demais mais troca
de memes então. Logo depois da leitura,
disseste: isso não foi poesia. Fora não a que
prometi. Marca aí. Vou ao Google. Muxoxo.
No fundo afobado a aflição de poder
ser a derradeira palavra…
Esqueci-me das chaves há um bom tempo,
agora que tocou no assunto.
Ela pensava que a pessoa é obrigada a ser feliz
Me embriago de café nesta tarde
sem Madama Butterfly,
quem sabe um sumi-ê.
Não.
Uma epifania buliçosa pela
cozinha, indícios de salvação.
Não.
Já é hora (falta pouco) para o jantar
então pego alface, tomate. Despedaçá-los.
Eis que encaro:
escarlate do fruto ou de meu
retesado sangue?
Esclareço:
corte no médio canhoto.
Ensaiar a fusão do mato mais vulgar
com a sinfonia (compô-la) da
amada, estalactite que quer submergir
no espírito com raízes da
natura perdida da felicidade.
No banho abro o registro. Choque
no corte mas a vida não
acorda só dormita estranha
perdendo tempo absorta e inútil.
Me embriago de mim mesmo
alcaloide à deriva
de furor trespassado pelo café
amargo que adentra
– escureza que desce nesta
caverna domesticada dando à
luz tolerâncias pantanosas na
plateia de uma ópera naufragada
em meio ao pânico do nada
pode ser feito.
Somente suportar a ração que
passa debaixo da lucidez inflamada.