Poemas de José Henrique Calazans
Os invisíveis
Não temos o desespero dos marginais
nem a insensatez da high society.
Não gostamos de nos olhar no espelho.
Não temos os corpos sarados das propagandas
e muito menos uma mente brilhante.
Não somos campeões de nada.
Nossas vitórias, quando vêm,
não merecem sequer aplausos
e nossas derrotas são tão ridículas
que nem ao menos dariam uma boa tragédia.
Não somos famosos, não somos ilustres,
não vamos entrar para os livros de História
nem para as páginas policiais.
Vivemos sempre à prestação
e quitamos nossa existência sem deixar saldo algum.
Não temos Utopia. Não faremos a Revolução.
Aliás, sequer desejamos vê-la.
Não possuímos grandes ambições,
mas temos esperança.
Não porque acreditemos no futuro,
mas porque o presente é entediante demais.
Somos tolos sem nenhuma fé,
em busca de um Deus subornável.
Somos um bando de infelizes
torcendo pro mocinho no final da novela.
Sobre o ridículo dos relógios
Por que aprisionar nossas vidas
em correntes de meses, semanas, dias,
submetendo nossa existência
à ditadura das horas?
Por que nos deixarmos levar
pelas voltas deste pião desvairado
que chamamos Terra?
Seria tão mais fácil esquecer os anos
e dividir nossa passagem por este mundo
em instantes de alegria,
momentos de emoção,
ou vivências inesquecíveis.
A Humanidade se entenderia melhor.
Quem me dera se eu pudesse
olhar bem fundo nos teus olhos
e dizer: “Tô com saudade.
Faz cinco sorrisos que não te vejo.”
E então matássemos toda saudade
contando o tempo em beijos.
O disfarce
Morrem as células, milhões a cada dia;
morrem os dias, quando o sol no oeste passa.
E, pouco a pouco, no silêncio e na agonia,
morrem memórias da bonança e da desgraça.
Morrem os sonhos, os amores, a alegria:
nossa existência é coleção de mil carcaças.
Quando nascemos, nossa morte a parca fia
e logo o berço com a cova se entrelaça.
A toda hora nós morremos lentamente,
em corpo e espírito o vigor se faz ausente
E se aproxima de seu fim nossa jornada.
Se a cada passo nós rumamos para o abismo,
dizer “vivemos!” é patético otimismo;
no fundo a vida é apenas morte disfarçada.