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Poemas para não perder, da poeta brasileira Golondrina Ferreira

"Poemas para não perder"

"Poemas para não perder"

(pintura de Edward Hopper)

Golondrina Ferreira é metalúrgica, poeta e militante dessa vida. Dos três ofícios, o de poeta é o mais recente mas diz estar aprendendo nos três. Abaixo, uma seleção de seus poemas do livro "Poemas para não perder", lançado pelas Edições Trunca em 2019.

SEGUNDA 

  

As máquinas, mortas. 

Nós, vivos. 

Logo se inverte a coisa. 

  

A fábrica tem fome, 

passou um dia inteiro  

de barriga vazia. 

  

Então abre suas bocas de catraca 

e nos seus dentes vamos passando 

um a um. 

  

Dá o sinal: 

nos mastiga 

  

e joga o bagaço fora  

no fim da jornada. 

ATESTADO

Atesto para os devidos fins 

que a paciente não se encontra 

em condições para o trabalho 

  

avisem os chefes 

suspendam as metas 

reportem aos gerentes de RH 

  

ela se encontra 

afoita 

eufórica 

tremendamente apaixonada 

  

devendo permanecer afastada de  

suas atividades 

até que o modo de produzir a vida 

não seja o de matar 

o amor. 

ENTRANDO NA LINHA

Não era isso que você queria 

quando procurou emprego? 

As condições já não estavam  

no contrato? 

  

Que parte faltou entender 

de que o ar condicionado 

é ajustado para as máquinas 

e não pra você? 

  

Que parte você não entendeu 

de que lá fora é pior, 

que para o teu posto 

tem pelo menos mais dezoito na fila? 

  

Você ainda não se deu conta 

que greve é coisa de vagabundo 

e organização, de terrorista? 

  

Todas as semanas você consegue, 

por que hoje não? 

Todos os outros conseguem,  

por que você não? 

  

Viu, é simples: 

abaixe a cabeça 

respire contido 

feche as pernas 

feche a cara 

feche a boca 

pinte as unhas. 

  

Não responda 

nem questione 

de preferência 

não pense 

mais que o estritamente 

necessário. 

  

Isso, muito bem. 

Gostei de ver. 

  

Quem olha nem imagina 

que você sabe sorrir 

e desobedecer. 

Golondrina Ferreira. Golondrina é metalúrgica e escreve seus poemas em meio à brutalidade da exploração do trabalho em uma fábrica. Uma voz operária, um canto de enfrentamento à burguesia, um canto da classe trabalhadora.  
Seus poemas, a maior parte deles inéditos também na internet, são necessários, são memória e história da classe trabalhadora, em versos.

O  livro “Poemas para não perder” foi lançado no dia 13/12. O Coletivo Trunca,  investiga, traduz e divulga poesia de luta da América Latina.

(clique na imagem para saber mais)

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