Receita de ano novo
O poeta itabirano sempre visitou os mais variados temas, acontecimentos sociais com os quais nos acostumamos culturalmente. Achamos oportuno abrir o ano com suas palavras, e desejar a todos um 2021 muito feliz e repleto de amor.
RECEITA DE ANO NOVO
Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)
Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.
Carlos Drummond de Andrade, “Receita de Ano Novo”. Editora Record. 2008.
Carlos Drummond de Andrade é um dos grandes escritores brasileiros, poeta, cronista e contista, o itabirano publicou uma extensa obra. Seu alcance não é por acaso, sua prosa e poesia dialogam lindamente, como dois olhos, e ainda encantam os que com ela têm contato.
Algumas obras:
No Meio do Caminho, 1928
Alguma Poesia, 1930
Poema de Sete Faces, 1930
Cidadezinha Qualquer e Quadrilha, 1930
Brejo das Almas, 1934
Sentimento do Mundo, 1940
Poesias e José, 1942
Confissões de Minas, 1942
A Rosa do Povo, 1945
Poesia até Agora, 1948
Claro Enigma, 1951
Contos de Aprendiz, 1951
Viola de Bolso, 1952
Passeios na Ilha, 1952
Fazendeiro do Ar, 1953
Ciclo, 1957
Fala, Amendoeira, 1957
Poemas, 1959
A Vida Passada a Limpo, 1959
Lições de Coisas, 1962
A Bolsa e a Vida, 1962
Boitempo, 1968
Cadeira de Balanço, 1970
Menino Antigo, 1973
As Impurezas do Branco, 1973
Discurso da Primavera e Outras Sombras, 1978
O Corpo, 1984
Amar se Aprende Amando, 1985
Elegia a Um Tucano Morto, 1987