A obra nasceu em tempos pandêmicos. “A poesia nasce onde a voz cala. Foi o espaço que
encontrei para exprimir o que pensava e não conseguia em qualquer outro meio”, explica
Catharina. Com isso, surgiu a ideia da obra. “A expansão, essa vontade da descoberta do
mundo, é o tema central do livro. Esse desejo pelo ‘sim’. Mas existem também alguns ecos
da infância, que eu acho um período fantástico, em que tudo se pode, e você tem essa
tapeçaria rica em imagens e associações. Para mim, o livro se desenrola entre o ‘eu’, a ‘casa’
(ou o umbigo) e o ‘mundo’”, define a poeta. “Houve muito mal-estar, físico, mesmo. Foi um
livro por vezes difícil de conceber e que ainda é, pra mim, difícil de ler, às vezes.”
Hosanna Almeida chama a poética que a Catharina constrói de abissal, usando a composição
de palavras mulher-abissal para falar da voz dos quarenta poemas que compõem o livro,
desse eu-lírico que se faz entre referências de ruas de cidade, mitologias, amizades, música
clássica e outros pilares que ganham contornos sensoriais a partir de versos livres e poemas
em prosa com destinatário certo. O abissal vem de água, do mergulho necessário para
escrever, se descobrir, se perceber pessoa. A mulher vem de algo mais, dos diferentes
arquétipos femininos que a Hosanna vê na escrita da autora e na forma em que eles se
manifestam.
Segundo ela, a mulher-abissal sabe que não pode ser sozinha, embora seja, embora esteja; e
por essas contradições, se estabelece o jogo poético de Catharina: o que constitui é o que a
repele; o que a atraia é o que a mutila. E completa: “ela sabe que carrega ‘essa multidão
dentro de mim’, que o cronista Rubem Alves chamou, pela inspiração da parábola bíblica, de
legião. Somos muitas, somos plurais, somos iguais. Desses vários Eus, que convivem — ora
pacificamente, ora belicosamente — nesse terno, e às vezes neurótico Eu poético
outrobiografado.”