Pedro tostes

O poeta Pedro Tostes fala sobre seu novo trabalho, Na Casamata de Si, sobre suas andanças, um pouco de sua história e como sobreviver com versos. Uma conversa descontraída em entrevista exclusiva à Revista Arara.

Pedro Tostes é poeta reincidente e insistente. Graduado Nos Rolês com PhD em Pilantropia Cultural. Seus crimes foram mais conhecidos como “o mínimo” (2003), “Descaminhar” (2008), “Jardim Minado” (2014) e “Na Casamata de si”. 

Foi detido, averiguado e apreendido pelas autoridades por porte e comercialização de livros em prestigiosa Fresta Literária. Com a organização delituosa “Poesia Maloqueirista”, entre outros crimes, editou a infame revista “Não Funciona”, que realizou 20 golpes bem sucedidos com mais de 20 mil incidências literárias na primeira década do século. Apesar da aparência dócil e gentil, o indivíduo citado apresenta alta periculosidade. Sua cabeça está a prêmio. Caso o encontre, favor informar às autoridades. 

Jardim Minado e agora Na Casamata de Si. O poeta Pedro Tostes está em guerra?  
O poeta Pedro Tostes está em guerra

Os tempos são tempos bélicos. De certa forma, eu me antecipei a esse momento em 2014, já percebendo o clima depois das manifestações de junho de 2013. A barra já vinha pesando, e a vida se demonstrou muito bélica nesses últimos tempos. Com isso, creio que foi necessário que a poesia desse uma resposta também… com força, com vigor. Com uma capacidade de responder a esses tempos duros e bicudos que estamos vivendo. E acho que isso acaba se refletindo na minha poesia e de alguma forma acabou refletindo nessa repetição de ideia de eixo temático; dentro desses dois livros, né? Que são livros diferentes entre si, o Jardim Minado ainda era um livro mais leve, ainda tinha um jardim. Agora, realmente, os tempos se aguçaram e a gente ficou numa necessidade de estar mais em pé de guerra mesmo. Com o mundo e com o fascismo que tem crescido e se demonstrado presente na nossa rotina e no nosso Brasil no dia a dia. 

Os registros secretos da CIA não dão conta das vezes em que o senhor cruzou o país, superando até mesmo as distâncias cobertas pelas Marchas de Prestes. O artista precisa ir onde o povo está?

Sim, de fato a CIA me persegue, e tem tentado me resgatar, eles tentam me acompanhar, botam chip no meu celular, mas não conseguem dar conta de ver onde eu estou sempre. Porque eu estou sempre circulando. A circulação é uma estratégia, não apenas de defesa, mas também, de ataque. E quando a gente está viajando, e chegando nos lugares, e indo aonde o povo está, como você diz, a gente consegue fazer nossa voz ser escutada. Agora, por exemplo, estou aqui saindo do Uruguai, estive em Montevideo por uma semana, e vou a Buenos Aires, tentar abrir novas fronteiras para o trabalho poético. E eu acho que é isso, quem tem vontade de ser poeta, de fazer poesia, tem que pagar esse preço, tem que ter a coragem. E esse é o meu caminho, o que eu escolhi, o caminho da estrada. O caminho de quem vai pro mundo de encontro ao outro. Essa é a minha poesia, essa é a poética que pratico, e é também o modo de vida que arrumei para poder me manter com poesia, manter minha vida e ser poeta. E, dentro do possível, também pagar as contas com alguma presteza. 

O artista precisa ir onde o povo está
Por que livros e não um mestrado? O senhor tem algum concurso público em vista ou alguma dica a quem quer sobreviver de literatura? 
Dica a quem quer sobreviver de literatura

Olha, eu faço livros de poesia e não mestrado porque eu não tenho esse viés acadêmico mesmo. Por mais que as vezes as pessoas me considerem alguém suficientemente letrado, eu não tenho esse direcionamento acadêmico na minha vida. Com relação à concursos públicos, não me adapto a esse tipo de rotina. Infelizmente. Já tentei e não deu certo. E com relação à quem deseja viver de literatura a primeira dica que eu diria é: Mude de ideia, não é nada fácil. Mas, se ainda assim, você for tolo o suficiente para tentar isso, se prepare para fazer uma boa lentilha, fazer pratos baratos, saber comer com pouco dinheiro. Conhecer os números de ligação da conta de luz, todos esses detalhes sórdidos da rotina e do cotidiano. De resto, a gente precisa ter coragem e muita disposição para tentar viver de literatura. Seja como for, seja pelo caminho que se escolha. Pode ser vendendo seus livros na rua, pode ser trabalhando como revisor, sobre tradutor, tentando fazer uma vida ao redor da literatura, de forma corajosa. Mas, se possível, mude de ideia.  

O senhor já foi preso por tráfico de informações por vender livros em plena festa literária. Valeu a pena porque a alma não é pequena?

Olha, tudo vale a pena se a paga não é pequena. Nós estamos aqui sempre cavando um espaço pelas margens, vendendo os nossos livros. E a gente tem que ocupar esses espaços sempre. A gente tem estar cavando e marcando presença, mesmo que se incomode uma pequena burguesia que se acha muito elitizada e muito inteligente e acha que estar na rua é diminuir a função do poeta. Por que tem esse preconceito, infelizmente. As pessoas acham que quando você está na rua você diminui a função do poeta, você é um poeta automaticamente menor. Eu não intento ser um poeta muito grande, eu tenho só 1 metro 75 (centímetros) de altura, nunca poderia ser tão grande. Mas também me cai bem saber o meu tamanho, saber o espaço que posso ocupar. E hoje, o espaço que ocupo é esse, às margens, os espaços da rua, das mesas. E quando você faz isso, às vezes você vai incomodar os poderes estabelecidos. E foi o que se passou comigo na Flip há dez anos atras, quando eu tive o meu material apreendido, por tráfico de livros dentro de uma feira literária, de uma festa literária.

Valeu a pena porque a alma não é pequena

E eles acham que realmente era uma coisa muito incongruente eu poder vender meus livros numa festa literária, é algo que é incongruente com a ideia deles. Mas como eles queriam que a Flip ficasse ali fechada no cercadinho da livraria oficial, e nós, poetas de rua, fazíamos isso por fora, eles acharam que de alguma forma, que a gente fazia concorrência. É um excelente elogio, ser chamado de concorrente de Carlos Drumond de Andrade, de Chico Buarque, de Manoel Bandeira. Mas não me crio como concorrente deles, no máximo, me dou por satisfeito em ser colega de profissão. 

Na Casamata de si está disponível gratuitamente em AudioBook

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