SALA
não sinto mais a ausência no sofá
não sinto mais a presença pela casa…
sinto quase uma paz n’alma
mas quando chega a noite
deixo a televisão ligada
para não morrer sufocado
pelo silêncio da sala.
CORREDOR
o corredor me leva para outro tempo
outra casa nesta que habito
entre os ruídos abafados da noite
e os passos dos vivos e dos mortos
que ainda moram dentro dela.
COZINHA
no fogão branco esmaltado
a combustão de gazes
nascidos da putrefação dos corpos
dos dinossauros mortos aquece
a comida que é preparada para os vivos.
SALA DE JANTA
na sala de janta
um prato a menos
uma saudade a mais
BANHEIRO
as águas do chuveiro lambem:
os braços as mãos o rosto
o pescoço o peito a barriga
as coxas as pernas o sexo
e são contidas impiedosamente
pelo ralo cheio de fios de cabelos
que ainda guardam o seu cheiro neles.
QUARTO
a cama recebe o corpo cansado
após a labuta na cidade
no macio do colchão
o homem é forjado
entre os sonhos e a realidade
que o espera no dia seguinte.
A PORTA DE CASA
a porta de casa
abre e fecha um mundo
a sete chaves
deus sabe como pesam essas chaves.
VARANDA
da varanda a vista se estende
para a diafaneidade de um céu azul
contido impiedosamente
pelo muro e o telhado de outras casas.
QUINTAL
no quintal feito mais de memória
do que abandono e jardins malcuidados
pode-se ouvir os gritos alegres de outrora
todos guardados dentro do homem sério
que olha e não se vê no espelho que o reflete.
O PORTÃO
do portão para fora
não se sabe
e sequer se tem ideia
do mundo que existe
além da solitária
proteção de ferro
que barra a travessia
das pessoas indesejáveis.