CAVERNA PÓS-MODERNA
Agora, imagina, Glauco, os homens em moradas muito belas
— numa época vista e tida como, de todas, a mais “moderna” —
bem diferentes de como as nossas velhas residências eram.
Imagina esses homens, no interior desses seus lindos lares,
soltos, mas cercados por muros e grades por todos os lados,
saindo só quando podem, devem ou não estão acuados.
Imagina-os todos prisioneiros muito mais em si mesmos
do que nessa cela que eles costumam chamar de abrigo ou casa.
Veja-os calados, com olhos vidrados em elétricas telas,
cativos em suas mentes, sem correntes nas mãos e nas pernas.
Eles pouco conversam, se olham, se ouvem ou até se percebem:
não há mais tempo nem mesmo para aquilo que lhes interessa.
Nessas mesmas telas, só sombras, sobras, fragmentos da vida,
e não a gigante e real dimensão que é estar vivo nela.
Pedaços de gente, de sonhos, de planos, de vozes, de ideias
pululam e mesclam-se; como fantasmas errantes se alternam
à procura de atenção, numa fila de espera, e vociferam,
nessa bacanal — ou baile de máscaras — onde tudo é festa.
Imagina, Glauco, esses homens com essas telas a sós falando,
por todos os dias de todos os meses de todos os anos,
procurando por ver a si mesmos e também os outros homens,
mas as janelas elétricas, que nada escondem, nem respondem,
ligadas, são luzes que não iluminam o que há defronte a elas,
desligadas, são espelhos mostrando uma cara cheia de fomes.